sexta-feira, 15 de março de 2013

A crise do controle democrático da violência.

Omissão, incompetência e desrespeito à lei por parte do Estado são fatores criminógenos decisivos. Estado produz homicídios em série. Só é defensável propugnar por rigor punitivo, se a pugna tiver como principal alvo o Estado e os governantes desrespeitadores da lei. Exigir punição de pobres sem punir sociedade por negar direitos constitucionais aos pobres é profundamente desonesto - para dizer o mínimo. O crime é socialmente produzido. Não existe relação direta entre crime e pobreza. Pobreza não pode ser tida como "causa" do crime. Todo e qualquer cidadão é potencialmente criminoso, uma vez que nunca haverá conformidade absoluta entre normas e comportamento efetivo. Quem exige punição para criminosos "pobres da favela" com discurso raivoso, esconde sua própria conduta criminal. Omite sua própria culpa. O crime não é uma atributo da favela ou dos pobres. Há muitos crimes da sociedade e do Estado, e a favela é a prova de um crime coletivo. Ódio racista e virulento de "elites" contra "vagabundos da favela" está em função de profundo medo de ter a própria culpa desvelada e punida. A favela no Brasil é a prova do crime que sociedade, governantes e Estado cometeram e cometem ao gerar exclusão e segregação de co-cidadãos. No Brasil, quem vitupera contra direitos dos outros, costuma ser exímio e arrojado mobilizador de recursos na defesa de seus próprios direitos. Sujeito pede punição rigorosamente exemplar para pobres, mas usa prestígio social para garantir a própria impunidade e a dos seus. A correlação a ser feita na análise da relação de poder e dominação que aí se descortina é entre crime e desigualdade, não entre crime e pobreza. Pois pobreza e desigualdade são fenômenos vizinhos mas sociologicamente distintos. Não houve, não há e jamais haverá sociedade humana que tenha conformidade absoluta entre código e prática. É nesse sentido que Durkheim afirmava que o crime é um fenômeno social normal. Faz parte do funcionamento da sociedade humana. Mas há situações onde a sociedade perde o controle sobre a dinâmica criminal, são casos que Durkheim chamaria de anômicos. A crise do controle democrático da violência é uma função da crise da crença na sociedade democrática e vice-versa, de modo circular. Acúmulo de violência letal armada é função da crise da institucionalidade de recursos pacíficos estatais e comunitários de mediação social.

Nenhum comentário:

Postar um comentário