sexta-feira, 9 de março de 2018

Fazer a guerra contra a guerra?

Não se pode resolver os problemas das guerras entre as facções, fazendo uma guerra contra as facções, pois o modelo da guerra favorece o fortalecimento das próprias facções. As muitas baixas não as atingem. Possuem fontes amplas e numerosas de recrutamento. As facções lidam com as "pessoas descartáveis" que foram produzidas pelo sistema. Recrutam entre os que foram relegados a uma zona permanente de abandono social. Portanto, fazer a guerra às facções é o método de demissão dos governos frente ao problema. É o modo de mostrar que está fazendo algo, mas, no fundo, a guerra é para evitar o envolvimento, para evitar assumir responsabilidade públicas, que acarretam em investimentos públicos, nas áreas deflagradas e faccionadas. Os governos produzem a facção. E as facções financiam diversas redes de poder, incluindo nela agentes do Estado e do próprio governo. São os parceiros inimigos. Os parceiros no contexto de guerra. A guerra é o mote para justificar não fazer nada, exceto deixar a guerra gerar suas lucratividades pela unificação de mercados ilegais em conexão com mercados legais. E as baixas da guerra? Para os poderosos, são baixas de elementos descartáveis. Baixas de pessoas que não merecem ser salvas.

quarta-feira, 7 de março de 2018

Esboço de ideias para se pensar o problema das facções como questão política

Nada mais integrado do que o desejo do crime. O crime é o desejo do dominante. O papel das facções é apoiar o estado na atividade contrarrevolucionária. As facções são agentes do capitalismo. Despolitizam as periferias. As facções são o braço armado do Estado capitalista. São a polícia do crime. O crime do andar de cima e do andar de baixo são movidos por desejos de poder. Crime é desejo. Não é necessidade. Mas não é mera escolha. Traficantes de drogas foram e são aliados da polícia na repressão política. Polícia e facções, essa guerra é para impedir a revolução social. É para travar as periferias. Neutralizar sua capacidade de transformação. Defender as facções é defender o Estado capitalista em sua capilaridade periférica. Os estilos de vida e consumo dos ricos e poderosos estruturam o campo de desejos do crime. O crime é o desejo de celebrar a capacidade de escolher com recursos desejantes garantidos. O desejo do crime é ser capaz de mobilizar a legalidade a seu favor, tornar-se um crime legal! O crime legal possui seguidores legais. Quem conhece bandido, não confia em bandido. Quem conhece polícia não confia na polícia. Desconfio de quem elogia um ou outro. Seja quem for . Faça o que fizer. Sou contra a romantização de quaisquer criminosos. Seja do andar de cima ou do andar de baixo. Sou contra o Estado que eles representam. Romantizar o Crime é um erro crasso. Ou uma desonestidade grande. A captura da guerra social entre ricos e pobres pelo modelo da guerra entre crime e polícia é um poderoso meio de despolitização da guerra social como luta entre classes na busca por democracia real. O efeito de criminalização justifica a vigilância constante do potencial de revolta coletiva das classes populares. O medo da delinquência que é produzida pelo Estado justifica a repressão contínua contra os pobres. O modelo da guerra é o carro chefe de reprodução do sistema de dominação. A luta entre as classes, ao contrário, é a politização da guerra social. É sua superação. Os governos atuam como investidores das empresas ilegais nas periferias ao desinvestirem seus poderes reguladores sobre o território. O governo é produtor de facção. Há um engodo quando se diz que estar no crime das facções é uma questão de sobrevivência. É uma forma de esconder que o desejo do crime é o desejo de ser dominante. De ter poder, prestígio, status. Esconder que um sentimento de superioridade é machucado por uma situação de indigência que afeta negativamente o desejo de ser grande. A sobrevivência é uma característica da vida do trabalhador, não da do bandido. Dizer que está no crime para sobreviver é uma conversa fiada. Quem vive de sobreviver é o "otário " submetido ao trabalho precário. Se sobrevivência explicasse alguma coisa, além da retórica, a maioria dos integrantes das classes populares estaria no crime das facções, mas não está. Ao contrário, é refém do regime de terror da guerra entre facções e polícia.

domingo, 16 de abril de 2017

Violência contra crianças, adolescentes e mulheres.

A violência doméstica contra crianças e mulheres é uma das fontes mais graves de desrealização social e injustiças. É uma violência que afeta de modo negativo toda a sociedade, sem exceção. Mesmo que grande parte da sociedade pareça persistir na ideia de que se trata de um problema do outro.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Abordagens policiais

RESULTADO PARCIAL DE UMA PESQUISA EM ANDAMENTO Não é impossível, para uma rapaz negro da periferia, conseguir ser abordado pela PM e sair vivo, incólume, do ponto de vista de agressões físicas. De acordo com minhas pesquisas de campo, com ajuda de colegas, a maioria relata que conseguiu se sair relativamente bem de uma abordagem. Contudo, é um lance que confirma a regra. Para um rapaz negro da periferia, sem antecedentes criminais, conseguir sair de uma abordagem policial sem ser fisicamente agredido, ele precisa ter, além de sorte, ou seja, de não dar de cara com uma minoria de PMs, uma minoria surtada (adoecida sem chances de receber atenção que deveria receber), que atrapalha até o serviço dos colegas de farda, pois está fora de si, mas é uma minoria, precisa também ser muito "respeitoso", ou seja, não escorregar na laranja, não ser "inchador", seguir o ritual de poder, de subalternidade, de saber ser abordado. De dez, seis conseguem se sair bem nesse teatro diante da autoridade. Quatro, ou pisam na bola, fazendo algo que é considerado coisa de "inchador", ou estavam marcados para apanhar, ou não tiveram sorte e pegaram um "doido". Esse resultado não pode ser generalizado, é baseado numa pesquisa empírica que fiz bastante restrita com 24 jovens apenas. Mas o dado é que 60 a 70% relatam que escaparam de agressão física e 40 a 30% relatam que foram fisicamente agredidos. Já moralmente, cerca de 90% relatam que foram agredidos, com gritos, ameaças e outras coisas do tipo para impor medo, autoridade etc. Os Pms me relatam que é uma estratégia que eles chamam de agir com energia. Uma ordem que é verbal, para sentir quem manda. Muitos Pms são contra a agressão física, mesmo quando concordam com a firmeza na voz de comando, pois segundo os Pms, podem estar diante de alguém armado e podem morrer, é uma situação delicada. Mesmo que apenas no início da abordagem, com o famoso "vagabundo", e há casos em que o PM, depois de ter chamado de "vagabundo", no início da abordagem, sem agredir fisicamente, ao final da abordagem, diz "boa noite, cidadão. estamos fazendo assim pra proteger". Como se fosse uma desculpa. Interessante, né? E ela é aceita pela maioria como normal. Outra coisa interessante é que há elogios a certas equipes de PMs, os próprios jovens elogiam, dizendo que tais e tais grupos sabem fazer a abordagem corretamente. Isso me chamou a atenção também. A maioria dos jovens diz que foi abordada corretamente. Mas que 30 a 40% digam que não foram, isso talvez seja muito alto, não? Vou buscar parâmetros de outros lugares para comparar. Aceito sugestões e críticas. Estou tentando descrever de acordo com a pesquisa. Mas é um tema muito polêmico. Difícil de ser descrito.

domingo, 24 de maio de 2015

Por uma nova política de segurança pública: a segurança como direito relacional.

Na minha opinião, o foco principal das políticas de segurança pública deve estar centrado na investigação dos mercados ilícitos de armas, no varejo e no atacado, não apenas retirar armas ilegais de circulação, mas desfazer o circuito comercial das armas. A arma ilegal aumenta a letalidade dos conflitos interpessoais. Por outro lado, a taxa de elucidação de homicídios teria de subir consideravelmente, para isso, é preciso forte investimento na inteligência policial (não estou me referindo a Coin e P2 da PM) e polícia investigativa, em especial, investir numa nova estrutura da Polícia Civil, que está bastante frágil. Aliás, o fim da dualidade PM e PC, a construção de uma polícia unificada, com carreira única, profissional, legalista e cidadã. Desmilitarizada também. A impunidade gera não apenas a sensação de insegurança, gera também novos homicídios dolosos. Pois um homicídio leva a outro que leva a um terceiro e assim por diante, um tipo de circuito de vinganças que não se interrompe. O problema não é apenas policial. As polícias não podem ficar sendo tratadas como elementos isolados. Sem o sistema de justiça criminal, sem mudanças no sistema prisional e sem participação da sociedade civil, as mudanças são inviabilizadas. A segurança é um direito relacional, exige mobilização ampla. Uma política pública cujos beneficiários não participam ativamente da concepção, da avaliação e da execução possui um caráter muito restrito. Não são técnicos, especialistas e cúpulas, trancados em reuniões de gabinete, que irão de cima para baixo resolver o problema. Os problemas precisam ser resolvidos desde baixo. As bases sociais e políticas de uma ação, de um programa, são a chave do sucesso da política. A verticalização, a elitização e a postura tecnocrata não ajudam a realizar o grande desafio: a democratização do controle coletivo do crime.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

ARMAS DE FOGO E SOCIALIDADES MASCULINAS EM GUERRA

Se, de um lado, há crenças que validam o uso da violência armada para confrontar problemas interpessoais e, de outro, há um arsenal de armas de fogo imenso, além das armas que circulam como mercadorias ilícitas, o fenômeno da morte matada por arma de fogo torna-se um ponto crítico do modo como consideráveis segmentos da população masculina do país está afetada por códigos de credibilidade cujo eixo central é o do "querer falar mais alto do que o outro". A violência armada é uma derivação de uma socialidade armada aprendida nas formas e nos espaços da masculinidade concebida como atitude de ser capaz de fazer a "guerra" contra quem falta com a devida "consideração" que se espera coletivamente haver nas relações sociais entre homens. A percepção de uma falta de consideração, tal qual uma profecia autorrealizadora, como performance, à ação situada no plano do "antes a dele do que a minha", referindo-se aí à dor que será provocada nas respectivas mães daqueles que são inimigos potenciais no contexto situacional em que se avalia moralmente a falta de consideração. Ser considerado envolve um desde de poder das masculinidades armadas.

A VIOLÊNCIA LETAL, ARMAS DE FOGO E PESSOAS PRÓXIMAS

Em geral, motivações passionais, brigas interpessoais e atentados contra a vida de desafetos, somados, respondem por mais da metade das lesões provocadas pelo uso de armas de fogo. Muitos agressores são pessoas conhecidas, companheiros e familiares. É mais usual sofrer lesão por arma de fogo destas pessoas do que de desconhecidos ou de assaltantes, por exemplo. A pessoa comum, conhecida, familiar, colega, companheira, próxima e do círculo social da vítima mata muito no Brasil. A presença da arma de fogo, o que venho chamando de agência das armas, potencializa a letalidade de conflitos interpessoais.