terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Violência homofóbica no espaço escolar: uma reflexão.

Escola Paulo Freire. Foto/Thiara Nogueira (OPOVO)



Para o educador Paulo Freire, há uma diferença crucial entre manter contato com alguém e criar relações com os outros. O contato é um tipo de interação característico da animalidade ao passo que a relação é o que caracteriza mais profundamente o que se pode chamar de humanidade, essa animalidade humanizada. Foi, portanto, com tristeza e estarrecimento que a sociedade cearense acompanhou eventos de violência num dos seus espaços escolares, supostamente incitada por um professor, que teria provocado com comentários homofóbicos práticas de violência física de um grupo de alunos contra aqueles que o professor teria estigmatizado com a transferência criminosa de seus comentários homofóbicos, tais quais relatados por testemunhas e apresentados pelo jornalista Thiago Paiva em matéria do jornal O Povo de hoje, intitulada Vítima de agressão acusa professor de estimular violência. “O professor levantou o comentário de que nós éramos gays. Isso deu origem a uma discussão na sala. Um garoto começou a me xingar, falar da minha mãe, e eu respondi. Ele passou a me ameaçar e disse que me pegaria lá fora”, contou o jovem de 14 anos ao jornalista de O Povo. Ele foi o alvo principal das agressões, mas um amigo de 16 anos que tentou defendê-lo também foi agredido.
O pai do jovem de 14 anos disse ao jornalista que “Como pai, estou sentindo e sofrendo a dor do meu filho. Não tem explicação. Ele é um menino bom. Não merecia isso. Todo mundo no bairro fica estarrecido quando ouve essa história. Nada justifica”. O que há de mais grave nisso tudo é que a violência física com motivação homofóbica teria sido literalmente incitada por um "professor", trabalhando numa escola cujo nome homenageia o grande educador brasileiro, Escola de Ensino Fundamental e Médio Professor Paulo Freire.
No espaço escolar a ele dedicado, batizado com o próprio nome do educador, não há espaço para a educação como prática para a liberdade, nem para a pedagogia da esperança e muito menos para a elaboração de uma pedagogia da autonomia. Um professor que promovesse agressões homofóbicas e incitasse estudantes a cometer atos de violência física contra outros estudantes poderia ser qualificado como o anti-educador por excelência. Os sentimentos fascistas de anulação e aniquilamento dos outros, dos diferentes, dos "estranhos", para lembrarmos aqui das excelentes reflexões e análises de Judith Butler sobre uma Queer Theory, realizam-se onde há a falência do projeto pedagógico, onde a educação se transformou em mero treinamento e procedimento de contenção e controle da subjetividade humana, em vez de provocá-la a duvidar de suas próprias certezas pela atitude crítica, reflexiva e humanizadora que é aquilo que a educação possui como principal desafio.
O embrutecimento homofóbico do espaço escolar revela a profunda violência de gênero por que passam moças e rapazes, adolescentes e jovens, que são alvos das mais perversas intolerâncias para com diferenças sexuais, de orientação sexual e de identidade de gênero.
Para finalizar, gostaria de lembrar que o colega Luiz Roberto Cardoso de Oliveira escreveu um artigo que já se tornou uma referência fundamental entre nós, pesquisadores e pesquisadoras do campo de estudos da violência, intitulado Existe violência sem agressão moral? e é a este artigo que remetemos o leitor, ele está disponível na plataforma Scielo, pois essa é a pista para entendermos o que se passa num caso tão brutal e estúpido como este.
Dispositivos morais que negam a construção da relação humanizadora com o Outro, baseando-se em contatos socialmente produtores de sujeitos embrutecidos e embrutecedores e que pela intolerância e pela falta de aprendizagem para a convivialidade na vida social plural, transformam-se em armas, por vezes letais, nas mãos daqueles e daquelas cujas vidas mesquinhas, medíocres, estão devotadas a alimentar o ódio e a desesperança no humano.

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