A Assembleia Legislativa do Ceará lançou uma campanha de prevenção e
combate ao uso de entorpecentes intitulada “Ceará Sem Drogas”. A ideia é
louvável, mas padece de, pelo menos, dois problemas estruturais. O
primeiro diz respeito ao título da iniciativa. Há um descompasso entre o
slogan da campanha e as pretensões dos parlamentares. A expressão
“Ceará Sem Drogas” induz a crer em uma meta irrealista, impossível de
ser cumprida. Especialistas em drogadição são unânimes em ressaltar o
fato de que nenhuma sociedade no mundo conseguiu se livrar por completo
do consumo de drogas.
O segundo problema está
relacionado à agenda política. Promover uma ação de grande porte como
essa em pleno ano eleitoral implica uma série de riscos. Em vez de
discussões técnicas, baseadas em experiências nacionais e
internacionais, promessas grandiosas e debates superficiais podem dar o
tom dos encontros. Sem uma mediação adequada, o que seria um momento
de esclarecimento e de informação pode se transformar em um espaço
privilegiado para a autopromoção. Cabe aos organizadores da campanha
tomar todos os cuidados para evitar que isso ocorra sob pena de
desperdiçar energia e tempo.
Os deputados podem fazer
muito pelo assunto em suas atribuições cotidianas no parlamento sem
precisar de uma campanha específica. Fiscalizar bem o governo já seria
algo bastante louvável. Matéria publicada no O POVO do dia 31 de
janeiro revelou que apenas 0,1% do orçamento estadual foi destinado ao
Programa de Enfrentamento às Drogas este ano. Como esse recurso será
aplicado? Quais as metas de atendimento a médio e longo prazo? Perguntas
como essas, se levadas ao Plenário, contribuiriam muito para que a
sociedade pudesse se mobilizar em torno do desafio que as drogas
representam.
Como o problema não se esgota apenas no
tratamento ao dependente químico, é preciso levar em consideração
outras frentes de atuação em que o Estado tem papel decisivo. Há muito
tempo os policiais civis se queixam das más condições de trabalho e,
mais recentemente, das diferenças salariais entre delegados e
inspetores. Como combater o tráfico sem meios para realizar uma
investigação adequada e sem que os policiais estejam motivados? Por que
é tão difícil de chegar aos grandes distribuidores de drogas? O que
pode ser feito a partir da atual realidade orçamentária estadual? Por
fim, mas não menos importante, é preciso que a AL debata de forma mais
aprofundada o mercado ilícito de armas de fogo. Embora seja costume
atribuir as causas da violência ao consumo das drogas, pouco se
questiona a facilidade de adquirir armas no Ceará, principal meio
utilizado para eliminar vidas. Mesmo com as apreensões crescendo ano a
ano, os homicídios só aumentam. Prova de que é preciso ir além do que
já vem sendo feito e de que é urgente buscar novas alternativas de
combate a essa rentável atividade criminosa. Para que os deputados
façam sua parte no que diz respeito à circulação indiscriminada de
armamentos não é preciso criar mais uma campanha.
Já é
suficiente que os parlamentares debatam essa questão com a seriedade
devida e que consigam colocar o assunto como tema prioritário na pauta
política do Governo do Estado.
Publicado originalmente em http://www.opovo.com.br/app/colunas/segurancapublica/2014/02/10/noticiassegurancapublica,3204344/a-assembleia-e-o-combate-as-drogas.shtml
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